sexta-feira, 5 de junho de 2009

A perda da memória, o tesouro escondido e o buraco sem fundo

No início do século passado um tio-avô meu, então com dez anos de idade, entrou para trabalhar em uma grande empresa. Começou como contínuo (função que nem existe mais) e saiu de lá como Diretor Comercial com quase setenta anos, direto para a aposentadoria. Permanecer tantos anos na mesma empresa pode não ter sido a melhor escolha do meu tio-avô (talvez, se ele tivesse sido mais ousado, pudesse ter chegado ainda mais longe), mas, certamente, foi algo precioso para a empresa uma vez que ele sabia tudo (TUDO) a respeito dela: era um arquivo vivo, uma memória esperta, uma fonte completa de informações sobre tudo e todos que passaram pela empresa no decorrer de tantos anos.
Ao sair da empresa meu tio-avô levou com ele uma boa parte da história da empresa.
Já nesse século, o profissional “nômade” é quem passou a ser valorizado: ousado, sempre em busca de novos desafios, disposto a encarar mudanças e sedento por novas experiências, ele nunca se acomoda. Aquele que passa anos na mesma empresa é visto com grande desconfiança, como o profissional acomodado, sem ímpeto, sem ambição, temeroso de se expor e de testar suas habilidades num ambiente novo. Se antes era com orgulho que os profissionais falavam que estavam há vinte anos na mesma empresa, hoje as pessoas que estão nessa situação tentam disfarçar para não serem vistos como acomodadas ou como aquelas a quem a vida não achou merecedoras de novas oportunidades. Antes, a permanência de um profissional na mesma empresa, atestava a sua competência, a sua confiabilidade, a sua lealdade. E, antes, as empresas tinham memória.
As corporações podem ter ganhado com profissionais mais ousados, mais competitivos, mais inquietos e que trazem consigo uma bagagem de experiência mais diversificada e uma visão mais abrangente, mas certamente perderam seu histórico. Investe-se naquilo que já foi investido anteriormente. Investiga-se aquilo que alguém já investigou. Iniciam-se processos e procedimentos que já estiveram em andamento. Isso não quer dizer que muitas coisas não tenham mesmo que ser feitas e refeitas inúmeras vezes porque as coisas mudam, o consumidor muda, as tendências mudam, e é necessário estar em sintonia com as mudanças.
No entanto, as empresas gastam muita energia e dinheiro tanto na busca de informações que elas já possuíam quanto na correção de rotas traçadas sem base em informações anteriores.
Funcionários novos, muitas vezes ficam cavando buracos sem fundo em busca de informações que apenas os que saíram da empresa e da função possuíam. E, muitas vezes, por acaso, encontra-se informações valorosas em institutos de pesquisa de marketing, em empresas de consultoria ou mesmo junto a parceiros e fornecedores. São como um tesouro escondido.
Falta às corporações “enxergar” que estão perdendo suas memórias -- e o quanto isso faz falta -- e se organizar de forma a mantê-las, se preocupando mais em formalizar, armazenar, partilhar e valorizar as informações. Não se pode permitir que a tendência de alta rotatividade de funcionários subtraia da memória da empresa informações que são a base sólida para a definição de tudo o que está pela frente.

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